Climate

Banda desenhada digital
Carta branca para o clima
Os Grandiloquentes estão entre a espada e a parede: como é que se pode escrever uma peça sobre as alterações climáticas quando nem sequer se consegue chegar a acordo sobre a forma de as explicar? A ciência climática pode pôr toda a gente de acordo, desde que se tenha uma câmara de infravermelhos e uma chávena de chá...
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Visão geral
Visão geral dos recursos
Neste episódio, as personagens encontram-se numa manifestação contra as alterações climáticas. As suas opiniões divergem sobre a questão da origem do aquecimento global, que um deles acredita poder ser natural.
Dirigem-se a uma cientista presente na manifestação, a quem questionam sobre o assunto e que os convida para o seu laboratório a fim de demonstrar o conceito de radiação infravermelha e a influência do CO2 através de algumas experiências.
Mais tarde, as personagens encenam estas experiências num espetáculo de rua no centro de uma nova manifestação pelo clima. Propõem uma representação do balanço radiativo do sistema terrestre que permite colocar o problema da relação entre a adição de CO2 , a radiação infravermelha e as consequências para a temperatura média da atmosfera.
Todas as experiências representadas na banda desenhada são disponibilizadas sob a forma de fotografias e vídeos (nos documentos editáveis associados à sequência didática proposta na última secção). As escolhas que compõem a abordagem proposta baseiam-se nos pontos de vista dos alunos e nas dificuldades identificadas na investigação sobre o tema.
Ao começar por experiências sobre os fenómenos fundamentais do aquecimento global, esta abordagem visa contribuir para a construção de uma confiança em torno do conhecimento do clima, antes das considerações mais técnicas sobre os modelos e as simulações climáticas. De facto, apesar do consenso científico sobre a origem inteiramente humana da alteração climática, este é ainda questionado por uma parte considerável da população.
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Opinião dos estudantes
As origens das alterações climáticas e a opinião pública
De acordo com o inquérito internacional EDF-IPSOS realizado em 2023 (24 000 pessoas em 30 países), 8% dos inquiridos continuam a negar a existência das alterações climáticas e 27% consideram que estas são principalmente de origem natural. A percentagem é ainda maior (32%) para o grupo etário 16-24 anos em 2022. Para além destes 32%, 10% dos jovens negam a realidade do aquecimento global. Este total de 42% de ceticismo climático entre os jovens dos 16 aos 24 anos é particularmente alarmante para a comunidade docente e para a sociedade em geral.
Dificuldades de compreensão do efeito de estufa
Foram identificados vários problemas na interpretação dos diagramas do efeito de estufa, alguns dos quais se devem a problemas inerentes à escolha das próprias representações. Estes problemas incluem a ideia de que os gases com efeito de estufa (GEE) formam uma espécie de "camada" ou "tampa" na atmosfera, formando uma "barreira" contra a qual parte do calor ou da radiação emitida pela Terra "ressalta" na sua direção, "prendendo" assim a "energia do Sol". Esta ideia é por vezes reforçada pela representação da radiação infravermelha a "regressar à Terra" sob a forma de uma reflexão óptica (que nada tem a ver com o fenómeno de emissão de radiação pela atmosfera).
Esta noção implica implicitamente uma ideia de cronologia, com a radiação a sair do solo, a ser impedida de sair pela atmosfera e depois a regressar à superfície da Terra, ajudando a aquecê-la "um pouco mais". Este tipo de raciocínio cronológico é incompatível com os esquemas mais frequentemente associados aos balanços instantâneos, isto é, em que os valores das potências de radiação são considerados ao mesmo tempo e em que a temperatura é constante. Outro aspeto problemático, assinalado tanto pelos alunos como nos recursos didáticos, é a não distinção entre os diferentes tipos de radiação (solar, infravermelha terrestre, infravermelha atmosférica). Este facto contribui para a ideia de que as radiações provenientes do solo podem ser "refletidas" ou "retidas".
A confusão entre os diferentes tipos de radiação pode estar ligada à dificuldade de introduzir o conceito de radiação infravermelha, um ponto que será objeto de propostas mais adiante.
Os gases podem realmente interagir com a radiação infravermelha?
Para demonstrar a capacidade de emissão e absorção da radiação infravermelha, o método mais comum é utilizar imagens de câmaras de infravermelhos com objetos mais ou menos quentes e mais ou menos transparentes. No entanto, estas observações são feitas apenas com objectos sólidos. De um ponto de vista físico, os gases não partilham todas as propriedades dos sólidos, por que razão deveriam ter as mesmas propriedades quando se trata de interações com a radiação? Até que ponto é que a extrapolação dos sólidos para os gases é aceitável para os estudantes? Foi realizado um inquérito sobre este tema. Após uma introdução à radiação infravermelha emitida ou absorvida pelos sólidos, os alunos foram convidados a dar a sua opinião a priori sobre as capacidades dos gases. Os resultados foram praticamente os mesmos para a emissão e absorção: mais de 3/4 dos alunos do ensino secundário (N=208) e 2/3 dos alunos do 3º CEB (N=280) responderam que os gases não podem emitir nem absorver radiação, ou que não sabiam. Perante esta constatação, coloca-se a questão de saber como introduzir estes fenómenos, dado o carácter crucial deste ponto para estabelecer a relação entre as emissões de CO2 e o aquecimento global.
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Perspectivas históricas e pistemológicas
As primeiras experiências históricas que evidenciam a interação entre o CO2 e a radiação infravermelha datam de meados do século XIX, realizadas independentemente por Eunice Newton Foot, nos Estados Unidos, e John Tyndall, em Inglaterra. A primeira estimativa quantitativa da possível influência do CO2 na temperatura global foi proposta por Svante Arrhenius, um químico sueco, no seu artigo "On the influence of carbonic acid in the air upon the temperature of the ground" (Arrhenius, 1896). Baseia-se na determinação do espetro de absorção da atmosfera a partir de observações da radiação reemitida pela Lua em diferentes comprimentos de onda, assumindo que a Lua tem um espetro de emissão próximo do da superfície da Terra.
Os primeiros modelos climáticos surgiram nos anos 50 e, desde então, têm sido aperfeiçoados, tendo em conta cada vez mais variáveis e as relações entre elas. A relação entre a potência da radiação infravermelha e a concentração de gases com efeito de estufa é descrita localmente, em cada ponto da atmosfera, através das chamadas equações de "transferência radiativa", que têm em conta a temperatura a uma determinada altitude. Estas equações, juntamente com as dos outros fenómenos envolvidos, são incorporadas nos modelos climáticos. Com estes modelos, é possível simular o clima passado sem ter em conta certos fatores, para determinar a sua influência em relação a outros. Em particular, quando simulamos as alterações climáticas desde 1850 sem ter em conta o aumento da concentração de gases com efeito de estufa e de aerossóis devido às atividades humanas, obtemos uma temperatura média globalmente estável (ver a curva azul na figura abaixo). Quando os fatores humanos são tidos em conta, as simulações obtidas estão muito próximas da variação da temperatura média observada desde 1850 (curva laranja). Estas simulações mostram que todo o aquecimento atual é atribuível à atividade humana.
Figure 1 - source : IPCC -
Abordagem didática
O objetivo do episódio é introduzir o problema da origem do aquecimento global (capítulo 1) e dar algumas respostas (capítulos 2 e 3). A abordagem didática escolhida, tanto para a banda desenhada como para os recursos, baseia-se em três opções principais, diferentes das mais utilizadas nos recursos didácticos sobre este tema.
Balanço de radiação entre o sistema terrestre e o espaço
A análise do balanço de radiação da Terra restringe-se ao sistema terrestre como um todo, ou seja, na interface com o Espaço.
Figure 2 Trata-se de uma escolha diferente de muitas representações existentes do efeito de estufa, que também esquematizam as interações entre a atmosfera e a superfície da Terra. Com estes esquemas, é possível demonstrar que não é possível tirar conclusões qualitativas sobre a influência da adição de gases com efeito de estufa na temperatura (ver Apêndice A). Além de ser mais facilmente acessível, o balanço de radiação na interface do sistema terrestre com o espaço permite evitar negligenciar os numerosos fenómenos da física da atmosfera que implicam outras transferências de energia para além da radiação.
Utilização do conceito de "potência radiante".
O foco no balanço das radiações que entram e saem do Espaço permite uma linha de raciocínio em que o conceito de energia não é necessário. A noção de "potência de radiação" é de facto suficiente para chegar a uma conclusão, e pode ser mais facilmente ligada a uma referência empírica, generalizando a noção de luminosidade. Esta escolha didática evita acrescentar à complexidade do conteúdo as dificuldades conhecidas na compreensão da energia. No entanto, a abordagem proposta é ainda compatível com uma reformulação ou um estudo mais aprofundado em termos de energia, em contextos em que tal se justifique.
Identificação das interações entre a radiação infravermelha e o CO2
O núcleo da abordagem pedagógica proposta, apresentada nos capítulos 2 e 3, baseia-se em experiências para demonstrar a influência do CO2 na radiação infravermelha, em função da sua temperatura. Estas experiências foram realizadas com uma câmara de infravermelhos de laboratório cuja gama de sensibilidade (3 a 5 micrómetros) cobre uma parte do espetro de absorção/emissão do CO2 (o que não é o caso das câmaras mais comuns, por vezes disponíveis nas escolas). Estas observações tornam acessível aos alunos com pouco ou nenhum conhecimento dos conceitos de comprimento de onda e de intensidade espectral uma referência empírica baseada na interpretação qualitativa de imagens de câmaras de infravermelhos, semelhantes às obtidas para os sólidos. A experiência é proposta utilizando balões com ar e com CO2 a uma temperatura inferior à do fundo, de modo a criar uma situação análoga à do sistema terrestre, em que o CO2 na atmosfera está, em média, muito mais frio do que a superfície da Terra.
Figure 3 Uma interpretação física mais precisa das observações de infravermelhos dos balões está disponível no documento descarregável abaixo (ver Apêndice B).
A etapa fundamental da abordagem pedagógica consiste em extrapolar, a partir destas observações, a influência da adição de CO2 à atmosfera no balanço de radiação da Terra. Esta extrapolação exige que se considere o efeito potencial de outras características da atmosfera, relativamente à situação dos balões (por exemplo, o facto de a atmosfera já conter uma certa quantidade de CO2 , bem como de vapor de água, ou de a sua temperatura diminuir com a altitude). Extrapolar a observação do caso do balão de CO2 frio em relação ao caso da atmosfera implica, portanto, assumir que estas diferenças não modificam qualitativamente a direção de variação da potência infravermelha de saída, mesmo que todas estas características influenciem o valor quantitativo desta diminuição. Embora não seja necessariamente possível discutir todas estas diferenças com os alunos, todas elas podem ser justificadas de um ponto de vista físico, algumas delas de uma forma bastante acessível, como se apresenta no Apêndice C.
Balanço de radiação e tendências de temperatura
Com base numa compreensão básica da ligação entre o balanço de radiação e a mudança de temperatura (ilustrada abaixo com um exemplo simples), a conclusão anterior permite prever como é que a temperatura do sistema terrestre irá mudar quando o CO2 for adicionado.
Porque é que os diagramas completos do balanço de radiação não nos permitem raciocinar qualitativamente sobre a influência do CO2?
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Recursos adicionais
Introdução à radiação infravermelha
Uma vez que este conceito é central na abordagem proposta, como é que pode ser introduzido aos alunos que não estão familiarizados com ele? Embora estejam geralmente familiarizados com imagens de câmaras de infravermelhos, pensam que esta lhes permite "ver a temperatura". A observação que se segue põe em causa esta interpretação: se fosse esse o caso, o vidro e a cobertura de plástico deveriam aparecer a azul.
Figure 6 Por vezes, os alunos partem do princípio de que o vidro e a cobertura de plástico foram aquecidos pelo corpo mais quente que se encontra nas proximidades. Vídeos de movimentos mostram que não é esse o caso, como os disponíveis nos diapositivos da sequência didática proposta abaixo.
Estas observações mostram que o que a câmara detecta tem duas coisas em comum com a luz: a capacidade de refletir (1) e de atravessar certos materiais (2). Estes pontos em comum permitem-nos introduzir um novo conceito: "radiação" como generalização de "luz". A luz pode então ser considerada como um caso de radiação "visível" (no sentido em que é percetível pelos nossos olhos), enquanto o tipo de radiação emitida por um objeto só é percetível com este tipo de câmara. Tal como a luz pode ser mais ou menos potente, as radiações “invisíveis” também podem ser mais ou menos potentes. A noção de "luminosidade" da luz (ou "potência luminosa") pode ser generalizada como "potência de radiação". O caso de um metal aquecido até à incandescência ilustra a relação entre radiações visíveis e invisíveis:
A partir de uma determinada temperatura, o metal emite radiações visíveis (1) e invisíveis (2), que são detectadas pela câmara. Quanto mais nos afastamos da chama, mais vermelha é a luz emitida (3). Após esta zona vermelha, resta apenas a radiação invisível (2), que se designa por radiação "infravermelha". A câmara utilizada para detectar esta radiação pode, portanto, ser designada por "câmara de infravermelhos". Mede a potência da radiação infravermelha em cada ponto da imagem, que é representada por uma tonalidade de cor. A potência da radiação infravermelha emitida por um objeto aumenta com a sua temperatura.
Fotos e vídeos das várias experiências com infravermelhos apresentadas na banda desenhada estão disponíveis nos diapositivos da sequência didática abaixo.
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Sugestões de utilização
Pré-requisitos
A abordagem didática proposta pretende ser acessível com um mínimo de pré-requisitos de física. Requer o conhecimento dos seguintes fenómenos:
- O conhecimento do mecanismo da visão (a luz que vai de um objeto para o olho), que conhecemos, não é evidente para os jovens alunos (de Hosson & Kaminski, 2006). A compreensão deste fenómeno é necessária para que as imagens obtidas com a câmara de infravermelhos possam ser interpretadas de forma semelhante.
- Compreender o sistema terrestre e o espaço exterior: o facto de a atmosfera ser uma mistura de gases, incluindo o CO2 , em média mais fria do que a superfície, e de o espaço exterior estar vazio de matéria.
- O CO2 é um gás emitido para a atmosfera pela atividade humana, principalmente através da combustão de combustíveis fósseis.
- Ser capaz de estabelecer a relação qualitativa entre uma escala de cores, os valores de uma grandeza física (potência de radiação) e a largura de uma seta que representa essa grandeza.
Para começar
Uma sequência didática pode começar com a leitura individual de todo o episódio antes da primeira sessão, ou apenas do capítulo 1 na aula, como leitura de grupo.
Capítulo 1 e posição do problema
O resto do trabalho girará em torno da seguinte questão, colocada no Capítulo 1: como podemos explicar o papel do CO2 no aquecimento global? Esta questão pode ser dividida em duas questões intermédias:
-Quais são as possíveis causas do aquecimento dos objectos em geral?
-Como é que o CO2 pode influenciar estas causas?
A primeira questão introduz o conceito de radiação infravermelha e o balanço de radiação, enquanto a segunda permite formular hipóteses sobre o efeito da adição de CO2 neste balanço, conduzindo às experiências com o balão de CO2 observadas no infravermelho.
Introdução à radiação infravermelha & capítulo 2
Após uma construção progressiva do conceito, tal como apresentado acima (recurso complementar), a leitura do capítulo 2 na aula pode proporcionar outras situações experimentais para os alunos estudarem, com copos de água fria e quente (todas as experiências representadas na banda desenhada estão disponíveis sob a forma de fotos e vídeos nos documentos editáveis associados à sequência sugerida). Esta situação é uma oportunidade para levar os alunos a trabalhar a representação da potência da radiação sob a forma de uma seta.
No final do capítulo 2, é apresentada a experiência do balão. Os alunos podem ser convidados a interpretá-las como um exercício. O início do capítulo 3 pode então ser visto como uma correção ou repetição deste exercício, antes de deduzir as consequências para a temperatura da Terra.
Representação do balanço de radiação do sistema terrestre
Para responder à questão colocada no capítulo 3, é necessário analisar o conceito de balanço de radiação. Para isso, podemos voltar à questão inicial, aplicada à Terra: quais são as possíveis causas do aquecimento global? Sabemos que a temperatura do solo depende da exposição à radiação solar, e também que existe uma relação entre a temperatura de um objeto e a potência da radiação infravermelha que emite. Podemos perguntar-nos qual é a relação entre estes diferentes tipos de radiação e a temperatura. Isto leva-nos a fazer um balanço de todas as radiações emitidas e recebidas por um sistema, chamado "balanço de radiação", para comparar a sua potência. A analogia e a experiência apresentadas anteriormente (secção de abordagem concetual) ajudam-nos a compreender a relação entre a natureza do balanço (equilibrado ou desequilibrado) e a evolução da temperatura do sistema.
Pistas progressivas para responder à pergunta final
Todos os elementos introduzidos até agora ajudam-nos a compreender a influência do CO2 na temperatura da Terra. As últimas páginas do capítulo 3 (p.81-90) fornecem pistas progressivas sobre as consequências da adição de CO2 à atmosfera. Uma forma de trabalhar esta última parte é fazer uma leitura em grupo deste último capítulo (episódio projetado no quadro), deixando que os alunos encontrem a resposta e acrescentando gradualmente informações adicionais para os ajudar se não o conseguirem fazer. Para isso, os alunos devem ter à disposição as conclusões intermédias da sequência.
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Sugestão de sequência didática
Editable file to download [coming soon!]
Créditos
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Cenário
Lau Bergey, Barbara Govin e Valentin Maron
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Storyboard
Barbara Govin
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Ilustração
Barbara Govin e Aline Rollin
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Webdesign
Gauthier Mesnil-Blanc
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Desenvolvimento informático
Clément Partiot
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Tradução
Valério Romero
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Investigação em educação científica em física
Monica Baptista, Cécile de Hosson, Simon Klein, Victor Lopez, Valentin Maron, Paulo Mauricio
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Agradecimentos
Ana Fernandes e os seus alunos
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Produção
Stimuli Eds
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Licença de utilização
CC BY-NC-ND 4.0 DEED
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ISBN
978-2-9593956-4-2
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Data de publicação
Novembro de 2024